As noites insones são as maiores delícias mortas na vida de alguém. É como se o tempo passasse sem passar, como se carro do Sol se levantasse e trouxesse um dia novo, sem parecer que o dia que foi ontem se foi para sempre. As noites insones te levam do quarto para a cozinha em busca de algo para beber e aquecer aquele frio que insiste em entrar pelas frestas da janela, e no meio do caminho ainda há uma tentativa de ligar a TV, mas logo se percebe que aquele mundo da telinha não é mais para você. As noite insones são acúmulos de horas que inquietam o espírito. Os olhos buscam leituras, letras, frases, períodos, poemas que balbuciam dores em cada verso, romances que esbofeteiam, filósofos tão incompreensíveis como as razões que te deixam desperto e com batimentos cardíacos acelerados em plena 4 horas de uma quarta-feira qualquer.
As noites insones castigam mais do que os remorsos dos velhos, aqueles remorsos de uma vida que foi perda, ruína e covardia. E não é demais pensar que o próprio Cristo teve a sua noite insone, no escuro Getsemâni, a procurar uma razão para seu sacrifício. Cristo compreende os insones. Ele conhece a agonia de querer dormir, do corpo pedir descanso e encontrar a resistência de pensamentos que não cessam de reclamar. A tolice ainda aumenta quando o cigarro é aceso, a nicotina afasta o sono como cruzes afastam maus espíritos, e ainda busca-se um café para completar o desastre, ou chá, ou os dois, mesmo o chá verde tem cafeína, um veneno a mais para a desgraça de ficar confinado entre o azedume característico das lembranças que não querem partir.
As noites insones são todas. Não lembro quando tive a última noite de sono saudável, regular noitinha gostosa envolto entre cobertas cheirosas das 22 às 7, uma delícia, acorda-se com a disposição de um conquistador, come-se pão fresquinho com um leite vaporoso de quente. Agora a minha hora é inversa a da maioria e eu estou a mil quando o mundo estaciona em letargia. Adormeço por momentos, resmungo, os sonhos são tristes e eu invejo aqueles que jamais se lembram deles. Como muito mal. Às vezes esqueço de tomar banho. Respiro o ar de um quarto que nunca está com a janela aberta, odeio vizinhos bisbilhoteiros. Sei que Deus me vê agora, este Deus absurdo que brinca com os homens em suas ironias, mas Ele eu tolero e não tenho como evitar. Penso como foi triste a agonia no Getsemâni, afinal Jesus não tinha livros, nem computador, nem café para lhe fazer companhia, e os folgados dos apóstolos estavam é dormindo. Era só Cristo com o desespero de uma noite que não se dorme. Eu sempre achei que estes infernos noturnos me seriam negados, mas eu estava errado.
E nas noites insones leio, escrevo, penso, leio mais, escrevo mais um pouco, busco uma saída e o presente de encostar a cabeça no travesseiro e simplesmente repousar - mas não acontece. Desejo que Hipnos embale meu pensamento e o deixe dócil, pequeno, envolto em nuvens etéreas - e ele não aparece. Ao contrário, tenho um coração que não pára e uma ânsia de absoluto que fica ao meu lado sugerindo planos para o próximo dia. Sou um atleta do devir. Especialista em fazer de noites inteiras um laboratório de tormentos e lágrimas, e com a sensação de estar enlouquecendo por isso sem ao menos dar importância.
Pois é tbm sofro desse divino mal.
ResponderExcluirA parte fisica debilitada é um grande problema.
Parabens pelo blog.
É,este sistema de receber por e-mail é legal tbm mas eu prefiro assinar feeds...Abraço!
ResponderExcluirQuer trocar links?
Eu não posso dizer que adoro ter insônia, mas que sofrer desse mal me inspira isso é verdade.
ResponderExcluirObrigada pela tua visita!
Um beijo e uma ótima semana!!!
Muito bem observado: estar a mil enquanto o mundo ao nosso redor adormece é foda. Às vezes é bom, mas infelizmente atrapalha nossas rotinas rídiculas...
ResponderExcluirTextos profundos, intensos. Gostei muito. Eu, particularmente, prezo mais pelo humor em meus textos, acho que encontrei no humor minha verdadeira arte e forma de protesto, principalmente se houver sarcasmo. Mas a morbidez dos teus textos são muito estimulantes também.
Quando quiser, passe no meu. Está meio abandonado, tenho dedicado pouco tempo à escrita, mas ainda existe. rs
Beijos!
"filósofos tão incompreensíveis como as razões que te deixam desperto e com batimentos cardíacos acelerados em plena 4 horas de uma quarta-feira qualquer."
ResponderExcluiradorei. mesmo.
Como a Tati disse, é uma morbidez estimulante.
vou vir te visitar sempre.
beijos