7.29.2012

O horror urbanístico de São Paulo

Foi o espírito de porco de um jacú classe média que transformou São Paulo na cidade horrível de hoje, assim como é esse mesmo espírito que a mantém como uma das metrópoles mais feias que já tive a oportunidade de conhecer. 

É sobre isso que fala o texto a seguir, surrupiado do blog Sorry Periferia, comentando sobre o documentário Entre rios. Ele ajudou a clarear muitos aspectos da cidade, trazendo dados sobre a história urbanística de São Paulo, e ajudando a entender por que uma cidade antes elegantíssima se tornou a vanguarda do mau gosto até chegar no limite da inviabilidade.

Sem mais delongas, eis o texto + o vídeo.
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Nos anos 1920, a encruzilhada urbanística em que São Paulo se perdeu



Em 2007, o chef americano Anthony Bourdain veio a São Paulo e começou seu programa de TV definindo a cidade assim: 

 “São Paulo é feia. Ou melhor: é feia à beça. É como se Los Angeles vomitasse em Nova York”. 

 O comentário causou alguma indignação, ainda mais vindo de um americano de Nova York que, se não é feia, ao menos não é famosa por sua beleza. Mas é impossível negar o fato de São Paulo ser paisagisticamente uma das sucursais do inferno na Terra, embora ela compense em outros fatores (como a gastronomia, elogiada por Bourdain no Sem reservas). 

 Vivo nela há 11 anos e tenho o hábito de me debruçar na janela que dá vista para o Minhocão lá no fundo enquanto penso sobre os descaminhos urbanísticos dessa vida. Eu, que nasci em Jundiaí, uma província cuja única vantagem sobre a capital são o ar respirável e os constantes pontos verdes ao alçance da visão, nunca me acostumei à filosofia paulistana, onde ganhar dinheiro e tolerar o microondas de angústias urbano são a marca registrada (não que eu não goste de ganhar dinheiro, mas essa não pode ser a única filosofia possível de um lugar pra se viver). 

Graças ao amigo Thiago Foresti, conheci um documentário curta-metragem chamado Entre Rios, trabalho produzido pelo coletivo Santa Madeira, que deu várias respostas ao que eu há anos tentava entender.

Resumidamente: a São Paulo de hoje é a confluência da cultura brasileira do “vai do jeito que dá e tem que ser logo”, especulação imobiliária e caipirismo de elite ao estilo “precisamos ser a Europa e os EUA na América do Sul”. 

São Paulo foi surgindo na confluência de vários rios. No início do século 20, as doenças causadas por mosquitos e a especulação imobiliária (sempre ela) fizeram com que o Anhangabaú fosse canalizado, e o Tamanduateí, modificado em seu percurso e tamanho. O Tamanduateí passava onde hoje é a 25 de março, daí a existência da Ladeira Porto Geral – era ali o porto do rio. 

Nos 1920, época de desenvolvimento e de reformulação urbana nas principais cidades do país, houve o embate entre dois nomes da engenharia urbanística. De um lado, Saturnino de Brito, o homem que projetou com sucesso os canais de Santos, viu a metrópole caminhando pra cima dos rios Tietê e Pinheiros e passou a pregar a organização de parques no entorno dos dois rios. Como os rios tinham cheias no verão, a várzea deles seria preservada, ninguém ali construiria e teria-se um enorme cinturão verde em torno deles. Isso faria com que São Paulo fosse brilhantemente verde. 

Do lado oposto de Saturnino de Brito havia Francisco Prestes Maia. Era o jacu classe média/elite tipicamente brasileiro: queria transformar São Paulo numa metrópole americana, com arranhas-céus e carros, e sempre do jeito mais fácil possível. Em vez de desapropriar casas pelo caminho, o projeto dele previa simplesmente canalizar ou encurtar os rios e fazer avenidas sobre eles. Prestes Maia ganhou a queda de braço e ainda tornou-se prefeito entre 1938 e 1945. E assim nasceram a 23 de maio, Consolação, Pacaembu, Ricardo Jafet, 9 de julho, Turiaçu, do Estado, Sumaré, Águas Espraiadas, Cupecê e tantas outras. Não preciso nem lembrar o quanto esse projeto também foi malsucedido socialmente (claro, não só por causa disso): as periferias cresceram sem qualquer ordenamento. 

Hoje não temos mais rios limpos, tampouco navegáveis – e do jeito que São Paulo era interligada por eles, poderíamos ter um complexo hidroviário impressionante nos dias atuais. Assim deu-se a expansão paulistana. O jeitinho brasileiro também deu as caras na arquitetura, que segue padrão nenhum (o padrão quem escolhe são as construtoras), os prédios não fazem sentido no ambiente do bairro ou da cidade, como deveriam fazer. O transporte público até hoje é preterido pelo automóvel, e as novas faixas das marginais estão aí para não me deixar mentir. 

Acima, você pode assistir ao Entre Rios. Tem só 20 minutos, recomendo muito. O documentário me fez lembrar daquele momento no De volta para o futuro em que Marty e o Dr. Brown voltam para 1985, mas tudo estava diferente. A conclusão era que eles pegaram uma outro caminho na linha do tempo que desembocava em uma outra vida em 1985, e que precisariam voltar correndo para a 1985 deles. Esse momento na vida paulista foi entre 1920 e 1940. Infelizmente, na vida real paulistana, não temos muito o que fazer.

7.10.2012

Blood of the Black Owl


Blood of the Black Owl é uma banda de Seattle formada em 2004 por Chet W. Scott. Conhecia dois trabalhos anteriores da banda (os excelentes "A banishing ritual", de 2010, e o split com o Celestial, de 2008); e ontem, através da Hex Magazine, ouvi o seu novo lançamento, o "Light the Fires!", lançado em 3 de julho último pela Bindrune Records - e o sentimento que me assaltou durante a audição foi de completa fascinação.

Musicalmente, Blood of the Black Owl é um monstro que mescla Funeral Doom com densidades etéreas cheias de misticismo e aura ritualística. Aliás, o elemento metal é o que menos comparece em "Light the Fires!", onde a atmosfera xamânica domina praticamente todas as músicas. Ontem, quando comecei a audição, de pronto percebi que não conseguiria fazer nada enquanto estivesse ouvindo o disco. Era necessário apenas ouvi-lo, deixando que as emanações de "Caller of Spirits", a música que abre o disco, controlassem totalmente minha atenção. Daí em diante a experiência foi seguindo por mais seis faixas, todas longuíssimas, que passaram como se fosse um simples abrir e fechar de olhos. Ouça agora: