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8.20.2012

Ph'nglui mglw'nafh Cthulhu R'lyeh wgah'nagl fhtagn


































Esboço do Cthulhu com data de 1934 feito por seu criador, Howard Phillips Lovecraft (20/08/1890 a 15/03/1937).


8.14.2011

Trecho de um conto do Lovecraft


"Freqüentemente imagino se a maioria da humanidade algum dia parou para refletir sobre o significado ocasionalmente titânico dos sonhos e do obscuro mundo a que pertencem. Embora a maioria de nossas visões noturnas talvez não passe de pálidos e fantásticos reflexos de nossas experiências em estado de vigília - ao contrário do que diz Freud com seu pueril simbolismo -, resta ainda um certo resíduo cujo caráter etéreo e invulgar não permite nenhuma interpretação comum, e cujo efeito vagamente excitante e inquietador sugere possíveis vislumbres momentâneos de uma esfera da existência mental não menos importante que a existência física, embora separada desta por uma barreira quase intransponível. Por experiência própria, não posso senão concordar que o homem, quando liberto da consciência terrestre, está na verdade vivendo uma outra existência, incorpórea, de natureza muito diferente da que conhecemos, e da qual permanecem apenas lembranças das mais fugazes e indistintas, depois de acordarmos. Dessas lembranças confusas e fragmentárias podemos inferir muito, mas provar pouco. Podemos supor que nos sonhos, vida, matéria e vitalidade, tais como a terra conhece essas coisas, não são necessariamente constantes; e que o tempo e o espaço não existem tais como nossos eus despertos os concebem. Acredito, às vezes, que essa vida menos material é nossa vida mais verdadeira, e que nossa vã presença sobre o globo terrestre é o fenômeno secundário ou meramente virtual."

Primeiro parágrafo do conto "Além da barreira do sono", de H. P. Lovecraft, e que se enquadra naquele seleto grupo de leituras memoráveis, onde vemos nossa confusa visão sobre um determinado assunto assumir uma forma cristalina.

4.19.2010

Relatório de leituras: Fante, Veyne e Goethe

Completamente doente o final de semana todo, inclusive febril na noite de sábado, meus dois últimos dias em casa foram lamentáveis. O odor acumulado de minha respiração/transpiração somou-se a tantos outros odores desagradáveis que brotavam de minhas lembranças, mas a esses odores é mais fácil se furtar: basta apenas um coquetel de remédios fortes, vem o sono e pronto, a tranqüilidade algo zen domina-me por completo e eu até sonho.

Ficar em casa curtindo uma doença, todavia, não é nem de longe algo ruim, levando-se em conta que há muito o que um homem doente pode fazer como, por exemplo, ler. E a minha leitura de convalescente foi O vinho da juventude, do Fante. Se você já leu Pergunte ao pó ou Espere a primavera, Bandini com absoluta certeza vai amar os contos desse livro. "Um de nós", o conto que na primeira orelha é indicado como um dos mais pungentes da obra, está certamente na lista das coisas mais tristes que já li, mas há momentos ainda mais tensos e poéticos, como em "Lar, doce lar" e "O Deus de meu pai". Ri muito lendo "A última jogada de Oscar" (o episódio da briga semi-xenofóbica dos garotos fala mais sobre geopolítica do que cansativos artigos de especialistas) e ri mais ainda lendo "A canção tola de minha mãe". Não me lembro do último livro que me fez rir assim, com verdadeira satisfação, e poucas páginas a frente me deixar pensativo e emocionado com as lágrimas de arrependimento de Jimmy Toscana, o alter ego que Fante deu para si nos contos reunidos nesse livro.

Algumas palavras sobre o título do livro. O vinho da juventude não é de todo ruim, afinal o vinho é quase um personagem dos contos, estando presente em praticamente todos eles. Porém o título original, Dago Red, tem um sentido completamente diferente: "dago" era o termo usado para pejorativamente designar os italianos nos Estados Unidos. O termo que em geral usa-se no Brasil (ou usava-se) é carcamano. Em uma tradução mais fiel, O vinho dos carcamanos seria mais adequado. Mas talvez as exigências politicamente corretas e/ou mercadológicas tenham norteado a decisão de suavizar o título original, se bem que eu não entendo como alguém, hoje em dia, poderia se sentir ofendido ao ser chamado de carcamano. Talvez um velhinho da Mooca fique vermelho de raiva ao ser chamado assim, mas tenho certeza que nenhum velhinho de lá lê o meu blog.

A doença que me fez recluso nesses dois dias também rendeu a redação de um novo (ou melhor, o esboço de) post para o blog da UGRA Press. Provavelmente, na próxima quinta-feira, que é o dia em que colocamos no ar as atualizações, ele será publicado. Estou ficando feliz com ele, pois me baseei em um ensaio do Paul Veyne, historiador francês que desde meu segundo ano da USP me cativou, seja pelo seu estilo elegante e debochado ao mesmo tempo, seja pelos controversos pontos de vista que ele arrisca de vez em quando. Em seu último livro, "Quando o nosso mundo se tornou cristão", por exemplo, Veyne sustenta que só nos tornamos cristãos porque Constantino se converteu. Não nega a extrema habilidade política do imperador ao levantar a bandeira dos seguidores da Cruz, mas em larga medida credita nossa herança cristã ao radicalismo de um homem só - indo contra a opinião largamente aceita de que o cristianismo, na época de Constantino, já era um culto largamente adotado no Império Romano. Para ele, a desconstrução do paganismo ocorreu de forma política, e não meramente pelo trabalho das primeiras comunidade cristãs. A diferença pode parecer sutil, mas guarda consigo uma radicalidade profunda: só falta Veyne escrever que tudo o que foi dito sobre o nascimento do cristianismo era uma bobagem.

Pausa para mais remédios. Essa semana, a leitura será Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister, de Goethe. Na quarta, coloco aqui o Canto II da Narrativa Mitológica de Curitiba. E aos que rezam, peço que rezem por mim, já que não tenho fé para isso.

10.16.2009

O Velho Safado disse

“Peguei minha garrafa e fui pro meu quarto. Fiquei só de cueca e deitei na cama. Nada estava em sintonia, nunca. As pessoas vão se agarrando às cegas a tudo que existe: comunismo, comida natural, zen, surf, balé, hipnotismo, encontros grupais, orgias, ciclismo, ervas, catolicismo, halterofilismo, viagens, retiros, vegetarianismo, Índia, pintura, literatura, escultura, música, carros, mochila, ioga, cópula, jogo, bebida, andar por aí, iogurte, congelados, Beethoven, Bach, Buda, Cristo, heroína, suco de cenoura, suicídio, roupas feitas a mão, vôos a jato, Nova Iorque, e aí tudo se evapora, se rompe em pedaços. As pessoas têm de achar o que fazer enquanto esperam a morte. Acho legal ter uma escolha.

Eu tinha feito a minha. Ergui a garrada de vodca e dei um vasto gole.”

(trecho do livro Mulheres, do Charles Bukowski, um dos homens mais sábios do mundo)

8.29.2009

Enquanto Agonizo, de William Faulkner - brevíssima resenha

William FaulknerTerminei a leitura de "Enquanto Agonizo", de William Faulkner, romance de 1930 que narra a saga dos Bundren, uma família de brancos pobres do interior do Mississipi. O período de composição da obra, segundo análise dos manuscritos, cerca de oito semanas - entre 25 de outubro e 29 de novembro de 1929. Faulkner escreveu o romance quando trabalhava como vigia noturno na usina hidrelétrica da Universidade do Mississipi e, segundo nota do editor que corrigiu o manuscrito, na maioria das vezes de madrugada - um exemplo de dedicação ao ofício de escritor e também a prova de que era um péssimo vigia.

A história: Addie Bundren, matriarca da família, morre. Para cumprir a palavra dada à esposa, que pediu para ser enterrada em sua cidade natal, Anse, o marido, leva os filhos Jewel, Darl, Cash, Dewey Dell e Vardaman a empreender uma desvairada viagem para levar o corpo de Addie Bundren ao seu descanso final. E o trajeto, que desde o começo já se mostrava um enorme desafio, transforma-se em uma seqüência de erros e golpes de azar que esta família enfrenta sem nem mesmo perceber, com qualidades dignamente estóicas.

Duas coisas a pontuar sobre a estrutura da obra: os capítulos recebem o nome dos personagens, que assumem o papel de narradores em primeira pessoa. Isso produz uma polifonia caleidoscópica no texto, onde um mesmo acontecimento é, por vezes, narrado de diferentes pontos de vista. Além disso, Faulkner conseguiu dar a cada um dos Bundren (cujos nomes registram a maioria dos capítulos) uma voz particular, identificável por certos traços estilísticos: frases que se repetem, escolha das palavras e até mesmo detalhes de pontuação. E no personagem Vardaman, o mais jovem dos Bundren (tudo indica que não deve ter mais do que dez anos), esta caracterização adquire seus contornos mais bem-sucedidos, com uma dicção acelerada, às vezes quase caótica, reflexo daquele espanto tipicamente juvenil perante o mundo, que se expressa na dificuldade de encaixar a realidade nas palavras e na incompreensão de certos rituais do mundo adulto. Cito abaixo um pequeno trecho de um dos capítulos mais legais de Vardaman, onde ele observa os urubus que os acompanham desde o início de sua jornada:

"Darl e Jewel e Dewey Dell e eu estamos subindo a colina, atrás da carroça. Jewel voltou. Veio pela estrada e subiu na carroça. Ele veio andando. Jewel não tem mais cavalo. Jewel é meu irmão. Cash é meu irmão. Cash tem uma perna quebrada. Nós consertamos a perna de Cash, então ela não dói. Cash é meu irmão. Jewel é meu irmão também, mas ele não está com a perna quebrada.
Agora eles são cinco, altos em pequenos e altos círculos negros."

Outro aspecto que me chamou a atenção é o estado de quase incomunicabilidade existente entre os personagens. Eles pouco se falam ao longo do romance. É o mundo interior de cada um que tece a narrativa, um mundo de desconfiança, lacunas e de densa melancolia. Isso me fez lembrar "Vidas Secas", do mestre Graciliano Ramos, cujos personagens também padecem do mesmo problema de comunicação. Mas excetuando esta coincidência e o fato de que ambos os romances retratam famílias de regiões rurais, nada mais há em comum entre os textos de Faulkner e do escritor alagoano. Contudo, aos que gostaram de Vidas Secas, tenho certeza de que também se deliciarão com a batalha dos Bundren pelo Mississipi. Como eu também me deliciei, praticamente lendo o livro todo em uma noite de pouco sono.

Edição de onde o trecho acima foi retirado: FAULKNER, Willian. Enquanto agonizo. [tradução Wladyr Dupont]. Editora Mandarim. São Paulo, 2001.

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